Por Júlia Pereira Damasceno de Moraes.
É extremamente entristecedor e preocupante o quadro atual de menos valia que a humanidade está atribuindo para o sofrimento do outro. A capacidade de permanecer apático ou mesmo cético, ou ainda com um estranho sorriso abobalhado, espantado e injustificável na face, a cada foto de alguém que tropeça e cai, de alguém que está sendo embalsamado para posterior sepultamento, de alguém cujo filho faleceu em um tiroteio com a polícia ou de imagens que retratam crianças que foram vitimadas por algum tipo de fanatismo também injustificável e qualquer coisa menos que humano.
Fico apavorada quando vejo um adolescente rindo ao ver alguém apanhando em vídeos que se disseminam indiscriminadamente pelo whatsapp e que são iguais às pragas em uma lavoura: representam nada mais que prejuízo e destruição. Também me apavora a falta de baliza moral ou emocional que leva um adolescente ou jovem a espalhar imagens que representariam o constrangimento de outro ser humano, como ocorre com os recentemente famosos “nudes” que tem virado um fatídico vírus em nossa sociedade.
É cultural? É contemporâneo? É resultado de uma capacidade sem fronteiras de mandar e disseminar informação? Ou é resultado da inversão de valores, da carência de valores que tem manchado nossa comunidade global tal qual fazem os óleos em mar aberto. De modo que representam morte, se não de mais gente, pelo menos da noção de humanidade, de compaixão e solidariedade. Itens escassos nos dias de hoje.
A banalização da morte e do sofrimento tem se propagado com maior velocidade, através das mídias virtuais. Há pais que sequer sabem como se opera o aparelho celular que, há muito custo, compraram para o filho adolescente e desprovido (talvez) da capacidade de entender realmente e profundamente o sofrimento e a dor que vê estampando a tela de seu celular. Assim, contribui inadvertidamente para propagar essa incapacidade, esse enrijecimento do que deveria escandalizar, doer em quem vê, incomodar, causar inconformidade e discordância. No entanto, o que se percebe é a formação de uma geração que ruma para os caminhos da incapacidade de se condoer, de se ofender, de se magoar pelo outro.
Isso se refere aos nudes, aos atentados terroristas, aos refugiados que morrem na praia, às crianças que apanham todos os dias dos colegas nas escolas, aos mortos que são protagonistas involuntários de fotos que viralizam e de catástrofes que tem endurecido o coração do ser humano, desumanizando-o.
Mas tal completa ausência de empatia é percebida desde os primórdios da nossa civilização. Há, no ser humano, uma fascinação macabra pela dor alheia, pelo sofrimento alheio. Não raro, vemos filmes históricos que mostram o sofrimento em vias públicas de alguém que foi julgado e condenado, não como caráter punitivo, mas como espetáculo para a plateia ensandecida e abobalhada.
É como se, de uma maneira absurda, o ser humano se alegrasse com o sofrimento do outro, porque afinal de contas, é do outro. Deste modo, vamos contribuindo conscientemente ou inconscientemente para a (de)formação do nosso futuro. O futuro da (des)humanidade.
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